Feliz Dia das Crianças
O autor…
Quando meus sobrinhos, Laís, 09, e Heitor, 07, e Maria Vitória, 09, minha priminha, nasceram, dei livros de presente a eles. Ao longo de cinco anos da vida de cada um, em aniversário ou data especial, tipo Dia das Crianças, a minha lembrança se repetia: livros. Até que um dia, sem mais nem menos, os três, em uma espécie de complô – tenho certeza que por maquinação de Heitorzinho – vieram até mim e disseram que queriam ganhar outra coisa. Argumentei em vão.
– Mas os livros mudaram a minha vida!
– Queremos outra coisa que tenha mudado a sua vida, tio – a Laís disse.
Não tive dúvidas e dei a eles uma carteira de trabalho assinada. Dentro dela, o endereço do local em que eles deveriam começar a função de mecânicos na semana seguinte.
– E aproveite, hein, porque vocês ainda têm benefícios trabalhistas. Em breve, férias e 13º serão luxos!
O trio voltou a pedir livros.
Me recordo dessa história porque o Dia das Crianças se aproxima. Não sei o seu coração, mas o meu, nesta data, continua batendo. Graças a Deus.
Lembrar a infância é a bala de banana mais saborosa de todas. Nas redes sociais, as fotos de perfis são alteradas. Todos os anos; e, apesar disso, sempre me pergunto como crianças fofinhas se tornaram o que são hoje.
Não nego que a afirmação valha para mim também, embora eu não tenha sido uma criança fofinha. Desde muito cedo, aprendi que precisaria lutar para conseguir alcançar os objetivos: e isso significava brigar com o Daniel, Ezequiel, Mateus, Marcos e todo mundo que aparecesse, pouco importando se o nome fosse bíblico ou não, se fossem da escola ou não, se tinham lanche para dividir ou não.
Me lembro claramente da primeira vez que meus pais foram chamados à escola devido ao meu comportamento.
– O filho de vocês é um gênio. Aos quatro anos, já sabe matemática, inglês, português, história, física quântica…
– Professora…
– …Tô concluindo. E o melhor é que ele escreve com as duas mãos…
– Mestra…
– …Só um minuto. Eu fico impressionada com…
– Diretora…
– …Que foi, mãe, que é tão urgente?
– Esse não é nosso filho!
Não era, de fato. Eu estava mais ocupado batendo em Moisés, considerado o menino mais especial da escola porque conseguia separar a água do copo dele.
Violências à parte, sinto saudades da infância que hoje resta apenas em minha memória. Pega-pega, esconde-esconde, futebol na rua até perder a unha do pé. Subir em árvores, pular muros, balança caixão/balança você, a macarronada de domingo na casa da vó. O mertiolate que ardia, o Biotônico Fontoura para abrir o apetite, o VHS na locadora, os trotes de orelhão. O colo da mãe nos dias tristes, o colo da mãe nos dias felizes. As histórias que meu pai contava, o ciúme das garotas que namoravam meu irmão.
Apesar de saber que a infância mudou, no fim das contas eu projeto o meu passado no presente porque Laís, Heitor e Maria Vitória são as crianças de minha vida hoje. É como se eu quisesse que eles vivessem o que vivi, só para ter o gostinho da minha criancice novamente. Sim, eu sei que é impossível. Então é preferível continuar dando livros ao trio.
Até porque eles ainda não estão preparados para consertar o motor de um carro.
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