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19 de abril de 2024

Indecente


Por Elton Tada/Passeio Publicado 27/09/2019 às 20h00 Atualizado 24/02/2023 às 10h08
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Se tem uma coisa que eu amo nessa vida é a classe média. Sério, pouca coisa me prende tanto a atenção quantos os movimentos desses sujeitos em busca da construção de suas vidas. Mas eu também não sou classe média? Sou sim, e acho cômicos meus próprios caprichos. É essencial saber rir de si mesmo. A diferença é que não me identifico com os ideais desse grupo. Não faço questão de ter uma casa parcelada em trinta anos. E gosto mesmo é de carro de bandido, meio velho, com rodas bonitas e vidros escuros. Não uso cartão de crédito, não compro roupa de marca e não estou guardando dinheiro para nada.


Não tenho poupança, não pago previdência privada, não participo de nenhum consórcio, não compro pacote de viagem para as férias. Aliás, não viajo nas férias. Não faço questão de água salgada, areia nos bolsos, nunca vi a neve e não tenho interesse algum em parque temático. Mas, então, o que eu faço da vida?


Primeiramente eu gostaria de deixar bem claro que não estou certo. Também acredito que não esteja errado. Não é questão de estar certo ou errado, é questão de ser e ser exatamente o que se é. O grande problema da classe média é a ilusão de que o ter pode potencializar a sua vida. Não, o ter não faz diferença alguma. A única coisa que se altera é sua percepção, e muitas vezes essa percepção nos prega umas peças bem sem graça.


Hoje eu vivenciei mais uma vez uma das coisas que me enche de alegria ao revés, o horário da saída da aula de algumas escolas particulares. Uma fila de pais parados em fila dupla, atrapalhando a passagem de uma quadra inteira. E eu te pergunto, pode parar em fila dupla? Não pode. E por que nossos queridos amigos se sentem no direito de fazer isso e fazem isso todos os dias mesmo assim? Porque eles são especiais. Bom, não que eles sejam de verdade melhores do que alguém, mas eles se sentem muito muito especiais. Se você que está me lendo para em fila dupla pra pegar seu pimpolho na escola você sabe o que estou falando. Você não se sente assim, no direito? O argumento é simples, não pode, mas não custa nada e é rapidinho. Sim, é rapidinho, mas são trocentos pais querendo fazer a mesma coisa rapidinha ao mesmo tempo.


A classe média não tem noção de coletividade porque foi educada assim, com a promessa da meritocracia, querendo se sobrepor aos outros, olhar de cima, estar no topo. Isso é tão verdade que a classe média não consegue nem se encaixar no grupo ao qual pertence. E me permita explicar, é rapidinho. Existem três grupos diferentes. O primeiro não se preocupa com dinheiro, pois sabe que independente do quanto consumir seus recursos não irão se esgotar. O segundo pode consumir tudo o que quiser, de um jeito ou de outro, possui crédito, mas sabe que seus recursos tem limite e que se exagerar vai ser difícil pagar a conta. O terceiro grupo é o que passa por privação, falta dinheiro pra remédio, pra alimentação e educação de qualidade. Desses três grupos a classe média está obviamente no segundo, mas ela se sente muito mais próxima do primeiro e aspira chegar lá. Nunca serão. A verdade é que a classe média está muito mais próxima do terceiro grupo, e é possível que em algum momento de sua vida venha a passar por algum tipo de privação.


Isso deveria ser o suficiente para nos tornar muito mais humanos. Não aceitaríamos a realidade da privação se percebêssemos que nós também podemos passar por ela. Mas, é o que sempre digo, a ilusão é grande demais.


Nós não somos especiais. Aproveite que você pode pagar uma boa escola a seus filhos e ensine-os corretamente. Não adianta aprender a gramática dentro da escola e ter um exemplo de estupidez na hora de ir embora. Seu carro é grande? Se vira. A escolha é sua. Estacione na outra quadra e ande um pouquinho. Ser decente não se trata de usar roupa curta ou ir sempre a uma igreja. Ser decente é ter um mínimo de sensatez.

Pauta do Leitor

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